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domingo, 29 de março de 2015

Kandinsky, tudo começa num ponto

  Um mergulho no universo do artista é o que a exposição "Kandinsky, tudo começa num ponto" nos presenteia. As raízes, a origem, suas paixões e trajetória podem ser vistas, lidas e ouvidas  numa reunião inédita de um conjunto de 156 obras (44 obras só do Kandinsky).      Quando dizemos que a busca pelo popular influenciou profundamente toda uma geração com a proximidade das guerras do início do século passado (e nesse caso específico também o Nazismo que iria ser um grande golpe também contra a arte e todo russo era persona non grata), vemos como o artista recorre a este universo particular, familiar, único para também se reestruturar. E, ao se reestruturar, inventava novas formas de representação. 
  E assim começa a exposição, com as origens e os ícones da cultura popular. Este universo nos é apresentado especialmente pelas peças do Museu Estatal Russo de São Petersburgo, que é a base da exposição, somando-se às obras de museus da Áustria, Inglaterra, França e Alemanha: São Jorge é um dos santos bizantinos mais venerado e foi canonizado na Russia antiga, sendo o padroeiro dos santos russos, o "Guerreiro Valente":


 à esquerda uma representação do Santo em meados do século XVI e à direita do último quartel do século XIX.

 O pássaro celestial chamado Alkonost:

 
 E, então , a espiritualidade na representação de Kandinsky:
O Dia de Todos os Santos, 1911
Wassily Kandinsky
Xilogravura em cores
 Coleção privada, Viena
  As obras "O Rio no Verão" e "O Rio no Outono" (1901-1903) são referências claras ao universo impressionista:


  Seus estudos, no período em que viveu em  Murnau (1909) com a também talentosa Gabriele Munter, sua ex aluna que se tornara - segunda - esposa: "lá eu aprendi a viver o quadro não por fora, mas por dentro"



  Os dois produzem uma série de "óleos sobre vidros", com os temas recorrentes da espiritualidade , cavaleiros, montanhas...do tal universo particular...

Gabriele Munter
A Madona com o Bebe
1909
Coleção privada, Alemanha
 Os demais de Kandinsky:




Do Espiritual na Arte, Kandinsky documenta as bases teóricas da corrente abstracionista:

Capa da 1ª Edição , Munique, 1912
  E, então, nas primeiras décadas do século XX, em especial no período em que vai lecionar a convite de Gropius na Bauhaus,na Alemanha, o tema "tudo começa num ponto" começa a fazer sentido e o objeto vai ficando cada vez mais dispensável...



  Outros aspectos da cultura popular e do xamanismo estão presentes neste mergulho no universo do artista, com símbolos que são incorporados em sua obra. É uma exposição em que precisamos percorrer com calma com tempo que nunca será suficiente para assimilar os diversos simbolismos presentes nas raízes do artista...


Kazimir Malevich
O Triunfo do Céu
1907
  E tem muito mais...seu contato com a música dodecafônica, que vai ser base teórica do seu abstracionismo...Bom, a exposição fica no CCBB até...AMANHÃ! 
  Saímos de lá com a presença de um Kandinsky mais familiar, com um artista ligado a cultura russa pela espiritualidade e pelo popular...um antepassado que o coloca na vanguarda da arte europeia.

  E fica a pergunta...







 

segunda-feira, 16 de março de 2015

Um passeio pelo Centro de Montevideo

  Vamos lá, confesso que está sendo difícil escrever sobre Montevideo. As comparações são inevitáveis: não é vibrante como Buenos Aires (nem com toda crise que acompanhamos); não é exótica como Cuzco e tantas outras cidades no Peru; não é intimista como Colonia del Sacramento, ex colônia portuguesa no Uruguai; não se mostra de imediato como La Paz e sua gente, não...não...Sim, é uma cidade de "sim": fácil de circular, gente sempre educada a falar, perguntar, explicar, num silêncio contraditório. Sim, é uma cidade que fala baixo, que sussurra a vanguarda dos fatos (direitos humanos, igualdades, questões ambientais, utilização do solo etc). Enfim, não percebi de cara qual é a de Montevideo e isso me instigou: aí, fui gostando aos pouquinhos. Como num desafio, ao final de 6 dias, neste carnaval de 2015, ao escrever este post procuro responder: qual é a de Montevideo? Vamos embarcar?
    Que tal começar pelo começo? Invariavelmente, todos os viajantes em Montevideo irão fazer o percurso pelo centro histórico da cidade. Este percurso é muito bem delineado e vou considerar como centro o trecho compreendido entre a praça onde está localizado o prédio da Intendencia Municipal até o Porto, passando pela Av. 18 de Julio e a peatonal Sarandi. Ao longo deste percurso, tinha interesse especial em visitar o Museu dos Azulejos (Calle Yi 1444) e o Museu de História da Arte(entrada pela lateral do prédio da Intendencia Municipal). O primeiro estava fechado e o segundo parcialmente aberto, mas valeu a visita!
    No prédio da Intendencia de Montevideo podemos pegar um elevador panorâmico e avistar a cidade do alto do 22ºandar. É grátis e devemos apenas pegar um ticket para controle do acesso num guichê de informação que existe na praça. Aproveite para retirar os mapas e pegar informações necessárias sobre funcionamento dos atrativos. Muito prestativos eles ligam para os locais desejados e te confirmam. Antes de subir, uma réplica da escultura de Michelangelo:
 
 
 
 
    O Museu de Artes, cuja entrada é na lateral deste prédio, foi uma grata surpresa, mesmo tendo visitado apenas parte do térreo. Havia uma exposição temporária de desenhos japoneses, Mangá e de objetos pintados com uma técnica conhecida por JATAM e acredita-se que tenha chegado ao Irã, pelos chineses e persas. A técnica consiste em criar um revestimento com mosaicos geométricos utilizando ossos de camelo e cobre; o resultado é...Lindo!


 A técnica JATAM:




  Parte integrante do acervo permanente, podemos ver uma representação pouco usual de São Jorge, cujo artista é um dos mestres do Renascimento - Donatello:


Baco, também da Escola Renascentista:


E a surpresa da visita:


    Esta peça é o  tímpano central da Porta Real da catedral gótica de Chartres, na França, que permaneceu íntegro após o incêndio de 1194. Representa Cristo Pantocrator acompanhado dos 4 evangelistas. O Homem simboliza Mateus; o Leão é Marcos; o Touro representa Lucas e a águia é João. Sensacional!



 
    Bem do ladinho do prédio da Intendencia temos o Mercado da Abundancia, que na verdade hoje reúne alguns restaurantes, que não experimentamos. Aqui funcionava o Mercado de Artesanto, que hoje está na Praça Cagancha, um pouco mais à frente, continuando o passeio pela Av. 18 de Julio:

Mercado da Abundancia


        Procurando o Museu dos Azulejos, que estava fechado, há umas ruazinhas charmosas que cortam a principal:

 
     Podemos ver a fonte dos cadeados para os enamorados....Garanto que  o fonte estaria mais bonita sem o cadeados, mas aí não seria a fonte dos cadeados, certo? Bom, de certa forma, um lugar só para eles e não estão espalhados pela cidade, danificando pontes ou tirando a beleza dos monumentos e paisagens.


   E, então, chegamos à Praça Cagancha, também chamada de Praça da Liberdade, devido ao monumento à Paz (quando se pôs fim a Revolução do General Flores, em 1865) instalado ali em 1867. É nesta praça que hoje se encontra o Mercado de Artesanato e também uma Biblioteca e o Museu Pedagógico, que fiquei curiosa, mas também se encontrava fechado:

Biblioteca e Museu Pedagógico

Mercado de Artesanato

Monumento à paz
    Vários prédios ao longo da Avenida 18 de Julio nos remetem ao Ecletismo italiano e também francês:



 
    Abaixo o Palácio Salvo sinalizando que estamos na Plaza Independência e imponente a escultura do General Artigas do alto do seu cavalo se apresenta. Muitos turistas apressadinhos passam direto e não descem para visita ao Monumento, que na verdade é um mausoléu. Vale a visita, pois há uma cronologia histórica bem montada a respeito de Artigas. Os guardas imóveis e indiferentes aos nossos cliques, vigiam as cinzas do General...
 


 
    Outra construção que nos remete à arquitetura classicizante italiana, logo ali ao lado desta praça, é a do Tetaro Solis. Em outra escala, percebemos traços do Scala de Milão, em especial  por suas rotundas e o corpo principal com as colunatas.

 
  Um ponto de vista mais charmoso da praça...que contrapõe com a arquitetura moderna e pós moderna, de gosto duvidoso, do prédio da Presidência da República:

 
 
 
    Nos limites da praça, o Portal que nos leva à peatonal Sarandi, vestígios da antiga cidadela, principal ligação com a Praça Constituição e com o Mercado do Porto.

 
  O que mais gostei na Peatonal? A livraria e restaurante Puro Verso, linda!

 
  E alguns espaços onde os uruguaios exprimem a sua alma vanguardista:


    Por esta peatonal chegamos à Praça da Constituição, o recanto mais francês de toda essa influência clara que podemos perceber ao percorrer o que deliniei como centro. Nesta praça é que se encontra a Igreja de San Juan, onde podemos ver um plano de desenvolvimento da cidade até o século XIX:



Igreja de San Juan



     Seguindo um pouco mais avistamos aquela fumacinha branca, ao longe: Habemus parrila! Para os amantes da boa carne, não tem mesmo lugar melhor para saborear uma, acompanhado do Medio y Medio: bebida que mistura espumante com vinho branco e que é uma delícia. Bom, fugimos dos tradicionais Roldós e El Palenque e arriscamos na Cabaña La Veronica e acertamos em cheio! Os cortes oferecidos são do Gado Hereford e o medio y medio espetacular, começando pelo brinde da casa!

Habemus Parrilla
 





 


La Cabaña Veronica:

 
E seu carro chefe:
 
Ao redor do Mercado, conseguimos perceber uma Montevideo mais autêntica:






E era carnaval!
 
Mas, o som que guardo da cidade, ainda é o silêncio...de uma cidade que sussurra e vai se mostrando bem devagar...